Dos Escribas à Internet: um pouco da história da profissão de secretário (parte II)
DE
FUNÇÃO PARA PROFISSÃO NOS ANOS 80
A função de
secretário, desde o seu surgimento na Idade Antiga, sofreu transformações significativas e
procurou acompanhar toda mudança no mundo dos negócios. Eram vários os
obstáculos contra os quais a categoria mantinha, e ainda mantém, sua luta
constante. Entre elas estava a imagem da “bonitona disponível no escritório”,
que tomava notas sentada no colo do patrão. Os meios de comunicação tinham sua
parcela de culpa por deturpar a imagem de quem exercia a função de secretário,
pois apresentavam quadros cômicos em que a atriz bonita e sensual fazia o papel
de secretária, jogando todo o seu charme para o patrão. Aliado a isto, estava
também o desconhecimento e a idéia machista de que qualquer mulher, contanto
que fosse linda fisicamente, poderia exercer as funções de secretário, e que
isto não exigia nem preparo nem treinamento, visto que tinham a visão
equivocada de que o seu trabalho não gerava resultados e nem produzia lucros.
Em 30 de setembro
de 1985, pela Lei 7.377, foi regulamentada a profissão de Secretário, depois de
tramitar por dez anos entre a Câmara e o Congresso. A lei, portanto, ao ser
institucionalizada, já era irreal tanto para a categoria profissional como para
o mercado de trabalho, deixando “lacunas que não enquadraram grande parte da
categoria”. (Natalense, 1998, p. 92). Novamente, os sindicatos da classe, que
surgiram em decorrência da regulamentação da profissão, iniciaram sua luta para
adaptá-la à realidade do momento. A adaptação aconteceu com a Lei 9.261, de 10
de janeiro de 1996.
A Lei 7.377/85
define os critérios para o exercício da profissão de Secretário Executivo e
Técnico em Secretariado, bem como as suas respectivas atribuições. A
institucionalização da profissão de secretário fez nascer em várias
universidades brasileiras o curso de Secretariado Executivo. Na Universidade
Regional de Blumenau, a primeira turma iniciou seus estudos no segundo semestre
de 1990.
O secretário
executivo, em conformidade com a Lei 7.377/85, é “o profissional diplomado no
Brasil por curso superior de Secretariado, reconhecido na forma de Lei, ou
diplomado no exterior por curso de Secretariado, cujo diploma seja revalidado
no Brasil, na forma de Lei.”
De acordo com o artigo 4º da lei, são suas atribuições:
planejamento,
organização e direção de serviços de secretaria;
assistência
e assessoramento direto a executivos;
coleta
de informações para a consecução de objetivos e metas de empresas;
redação
de textos profissionais especializados, inclusive em idioma estrangeiro;
interpretação
e sintetização de textos e documentos;
taquigrafia
de ditados, discursos, conferências, palestras de explanações, inclusive em
idioma estrangeiro;
versão
e tradução em idioma estrangeiro, para atender às necessidades de comunicação
da empresa;
registro
e distribuição de expediente e outras tarefas correlatas;
orientação da avaliação e seleção da correspondência
para fins de encaminhamento à chefia;
conhecimentos
protocolares.
O técnico em secretariado é “o
profissional portador de certificado de conclusão de curso de secretariado, em
nível de 2o. grau”, de acordo com o artigo 2o. da Lei
7.377/85. São suas atribuições:
organização e manutenção dos arquivos
da secretaria;
classificação, registro e distribuição
da correspondência;
redação e datilografia de
correspondência ou documentos de rotina, inclusive em idioma estrangeiro;
execução de serviços típicos de
escritório, tais como recepção, registro de compromissos, informações e
atendimento telefônico.
Diante dessas atribuições, a realidade
daquele profissional do secretariado cúmplice, passivo, que esperava
pacientemente pela delegação de tarefas e reconhecimento do chefe, estava
deixando de fazer parte do cotidiano das organizações. Passou a assumir novas
funções na sua rotina de trabalho, com a ampliação de suas tarefas. Passou a
dirigir a sua rotina, supervisionar trabalhos de equipes de apoio. Tornou-se
indispensável o conhecimento e a visão da organização em que atua, de seus
objetivos e metas. Para Farias (1986), o secretário deixou de ser um símbolo de
status para o executivo, para ser
peça vital do processo administrativo.
Nesta condição, um secretário
executivo passou a responder pelas tarefas de maior responsabilidade, ou seja,
atuar em nível de assessoramento, planejamento, organizando e controlando
tempo, rotinas, comunicações e imagens. Para tanto, foi preciso dominar todas
as técnicas secretariais e ter curso de formação que o qualificasse a bem
desempenhar suas funções. Na ausência da chefia, teve que estar apto a assumir
o trabalho e, para tanto, dominar as técnicas de supervisão e gerência. O papel
principal do secretário executivo constituiu-se em aliviar a carga de trabalho
de seu chefe, preparando tudo o que fosse preciso e possível para ele realizar
com êxito a sua missão, procurando entender seus planos e metas.
Medeiros e Hernandes (1995, p. 19) corroboram essa visão.
Em
suas funções diárias, a secretária deve ser mais que pessoa encarregada de
datilografia ou digitação de correspondência, manutenção de arquivo, de
atendimento de telefonemas. Ela, às vezes, é a ponte entre aqueles que tomam
decisões em nível gerencial e os que executarão tais decisões; muitas vezes, porém,
ela própria, tomando decisões, executa tarefas relevantes para a empresa. É,
pois, nesse momento verdadeira assessora, profissional altamente qualificada.
Com este perfil, era preciso “ser”
secretário executivo e não apenas “estar” secretário. Exigia vocação e não
meramente uma oportunidade de trabalho. Em muitas organizações, o recrutamento
e a seleção passaram a ser realizados pelo órgão competente da organização.
Cabia, sem dúvida, ao executivo, escolher pessoalmente quem trabalharia
diretamente com ele. Só que antes, a divisão responsável pelo recrutamento e
seleção encarregava-se de verificar e considerar as qualificações dos
candidatos, em consonância com o perfil exigido pela vaga. A afinidade de
personalidade entre a chefia e o secretário executivo é fundamental. Faria
(1986, p. 16) concorda quando afirma que o secretário executivo certo pode
conduzir o executivo a uma maior eficiência, e o errado “pode levá-lo ao divã do psicanalista.”
Algumas organizações começaram a
reconhecer a necessidade de desenvolvimento e a investir em treinamento e
reciclagem para secretários executivos. Timidamente, surgiam conversas, entre
os especialistas em recursos humanos, sobre um plano de carreira que
possibilitasse o seu crescimento profissional. Dificilmente falava-se em
promoção, o que explicava, em parte, o
desestímulo dos profissionais a se aperfeiçoarem.
Nessa época, simultaneamente, muitas organizações iniciaram
um processo de reestruturação em virtude da dinâmica do mercado de trabalho e
da economia mundial, que também passava por mudanças. Administradores e
empresários, no Brasil, passaram a se preocupar com o crescente aumento de
mão-de-obra para a execução de atividades rotineiras nos escritórios. A ideia
de automação dos escritórios não era mais ficção em alguns escritórios
brasileiros, apesar de restrita às grandes organizações, devido ao custo de
implantação.
Medeiros e
Hernandes (1995, p. 101) afirmam que a “automação surgiu da necessidade de
eliminar papéis, fichas, acabar com tarefas repetitivas, tendo em vista
principalmente proporcionar informações exatas, seguras e liberar o homem para
atividades mais criativas”. Entendem por automação “a utilização da tecnologia
de sistemas de informação para ampliar a eficácia do desempenho profissional, proporcionando-se,
conseqüentemente, maior eficiência”. A eficiência e a eficácia do secretário
executivo são favorecidas pela automação, aumentando sua produção. Para os
autores, “eficácia diz respeito a qualidade; eficiência, à quantidade. A uma e
a outra a automação proporciona resultados invejáveis”.
Para o secretário executivo, o uso do
computador eliminou a perda de tempo em tarefas repetitivas e monótonas.
Possibilitou o aumento de eficiência e da eficácia, não de uma hora para outra,
mas em um processo conquistado por etapas. Era preciso superar a fase de
adaptação que todas as organizações enfrentaram com a informatização dos
processos administrativos, bem como a visão de muitas chefias de que escritório
informatizado era sinônimo de redução imediata de pessoas. Diziam que o
secretário executivo não era mais necessário “porque qualquer gerente digitava
seus próprios textos, enviando-os por e-mail
e usava uma agenda eletrônica”, como confirma Natalense (1998, p. 40).
A eliminação dos
trabalhos repetitivos e a necessidade de se obter e tratar as informações,
exigiu do secretário executivo maior interação com as informações armazenadas
em computadores, por meio de modernos sistemas de gerenciamento e recuperação
de dados. Para isso recebeu treinamento. Quando não, procurou aperfeiçoar-se
por conta própria, caso contrário o mercado de trabalho o excluiria.
A utilização do computador nos
escritórios teve um impacto nas responsabilidades do secretário executivo e no
trabalho que realiza, proporcionando-lhe mais tempo para desempenhar seu papel
de assessor e de administrador de informações, em organizações que já estão
caminhando para uma administração calcada em novos paradigmas. Por esta razão,
o mercado de trabalho, em meados da década de 80, passou a requerer deste
profissional novos atributos, quais
sejam: domínio de informática, fluência em inglês, capacidade de redigir em
ótimo português ou qualquer outro idioma, espírito de iniciativa, conhecimentos
de administração de tempo e princípios de gerência. Na verdade, o mercado
passou a requerer um profissional habilitado a gerenciar mais do que ser mero
executor.
Texto
extraído de:
WAMSER,
Eliane. O impacto das mudanças
organizacionais na profissão de secretário e a contribuição do estágio
supervisionado em sua formação. 208f . 2000. Dissertação (Mestrado em Educação),
Universidade Regional de Blumenau, Santa Catarina, 2000.
Referências
bibliográficas
BERTOCCO, Neris e
LOYOLA, Angela Schneider. Você,
secretária. Rio de Janeiro: Livros Técnicos e Científicos, 1979.
D’ELIA, Maria
Elizabete. Profissionalismo: não dá
para não ter. São Paulo: Gente, 1997.
FARIA,
A. Nogueira de. A secretária executiva. 5.ed. Rio de
Janeiro: LTC, 1986.
MAERKER, Stefi. Secretária: a parceria de sucesso. São
Paulo: Gente, 1999.
MEDEIROS, João
Bosco; HERNANDES, Sonia. Manual da
secretária. 6.ed. São Paulo: Atlas, 1995.
NATALENSE,
Liana. A secretária do futuro. Rio
de Janeiro: Qualitymark, 1998.
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